terça-feira, 17 de abril de 2018

com labor, lido cru

    uma letra c que minha coluna vertebral escreve quando me sento para. escrever com o queixo colado no topo do encosto de costas da cadeira como se fosse uma letra l deitada ou. como se eu estivesse fazendo aquele exame antes de passar com o oftalmologista, a recepcionista me diz para focar no pontinho vermelho ao fim de uma pista de decolagem de avião, um desenho para elucidar o exame chato e. poderia ser que as palavras saíssem melhor se não fossem assim sempre interrompidas.
    trabalho do momento que acordo até este em que sento errado, a bacia pendendo do lado direito ao piso de madeira. se me molhar em banho agora, vou querer parar, e há muito a ser feito. cortar uma peça de bacon em pedacicos para os clientes do coquetel na joalheria morrerem mais cedo com maior coordenação motora (li na notícia que embutidos são cancerígenos depois li num livro que colesterol é amigo da função cerebral), colocar depois tirar minhas roupas coloridas da máquina de lavar na função delicada, arrumar a cozinha pela quinta vez. nunca passei tanto tempo na cozinha e é uma obsessiva construtiva compulsão. dou conta até de passar mal de fome ali porque não consigo fazer uma pausa de fazer uma comida para comer.
    o menino por quem me apaixonei está de saída. meu coração se aperta e sai chorume.
    meu segundo celular em um mês pifou e basicamente toda a minha minúscula vida profissional se organizava nele. perdendo a cabeça por um eletrônico eu percebo. como. somos de papel. abro meus livros de receita e como que numa degustação em maiúscula leio minhas letras c e l escritas com um padrão pesado em balança. ENTREMET ICKFD e depois PÃO DE LÓ ENRIQUECIDO CAMILA DUTRA. tudo o que eu tenho eu peguei de alguém e eu só posso ser uma segunda versão de uma segunda versão. esqueço que açúcar faz tão mal assim e como quase sozinha uma panela. depressão.
    focar no pontinho vermelho em cima do cupcake que é uma cereja falsa de chuchu. pesar os centilitros franceses cl cl cl cl. postura, segura a faca daquele jeito para evitar a tendinite, não pensa no menino indo embora. chorume. meu cachorro ao lado me observa como quem só quisesse estar mais perto. e estou indo para lá.


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