terça-feira, 16 de abril de 2019

o final de semana em que o chefe da menina se casou

no quarto do menino não havia TV e quando a menina ficava lá eles eram obrigados a fazer beijos abraços lambidas carinhos suaves e pesados eles eram obrigados a se morder e raspar até a pele e os ossos os músculos cansarem. à noite eles se deitavam como fios de fone de ouvido em nós difíceis de desfazer e respiravam ora silenciosa ora sonoramente em composições de dois instrumentos, o nariz e as sujeiras. acordavam, gemiam num único staccato, adormeciam.

antes do quarto sem TV ocuparam o menino e a menina assentos no mezanino do teatro ao lado das câmeras muitas que filmavam a orquestra que eles não sabiam mas tocava num dia muitíssimo especial e as senhoras ali iam de vestidos longos e coques e os senhores ali pressionados em cintos e gravatas acenavam olá mas o menino vestia seu tênis de andar em trilha e a menina bateu palmas quando entrou o violinista que apenas dava o lá. entre movimentos o menino complementava as partituras com toques de seus dedos nos fios da barba em seu rosto, não eram barulhos eram música, qualquer tempo em que se juntassem à sinfonia tornavam-na melhor. o menino dividia de bom grado a regência do maestro com seus sons de inspirar e mudar a disposição das pernas. a menina ouviu com importância e julgou que tudo estava barbaramente harmônico.

no dia seguinte do quarto sem TV a menina levou de sua casa para a casa do menino: 
1 unidade de vinho tinto 
1 unidade de queijo chancliche
ao que juntaram tudo isso com outras coisas de comer como pistaches, porque o menino tinha com eles incrível afinidade, como macadâmias sem torra e sem sal, porque a menina não encontrou as torradas e salgadas, depois perguntou ao moço que as vendia se havia, ele disse que sim e a menina disse, não quero. comeram com temperos regaram com limão o que mastigaram ao som de vinil no toca-discos que tinha seus macetes de manuseio, um aparelho que só tocava para quem tinha vocação nos dedos. o menino tinha jeito nas mãos e despejou o sauvignon em copos de beber água que harmonizaram perfeitamente com tudo o que vinha acontecendo ali. ele disse, esse é suavignon e a menina riu.

retornaram então ao quarto sem TV, viram o filme de si livre de quaisquer outros personagens. sumiram com o figurino fizeram dos álbuns de jazz salvos no spotify seus figurantes, beberam água de vez em quando para unir as cenas. cansaram de tudo isso já bem tombados de thc e enrolaram-se nos fios de fone de ouvido, a menina esmagada na parede o menino esmagando a menina demais. a menina acordava esmagada e pensava, isso é o máximo.

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